O fim do trabalho escravo e exploração sexual cede espaço para o respeito.
“Na minha cela tinha 13 homens. Não me deixavam comer ou beber. Me
acordavam com bucha quente nos pés. Me queimavam com plásticos. Meu
braço ficou muito ferido. Me batiam, colocavam sacos na minha cabeça.
Não podia avisar aos agentes porque não me deixavam nem chegar perto das
grades”. O relato é de Felipe de Lima, 26 anos, preso por assalto há um
ano. Ao todo, foram três dias de terror dentro de um dos quartos de
castigo do Presídio de Igarassu, na Região Metropolitana do Recife
(RMR). O motivo da violência? A orientação sexual de Felipe.
A história de quem quase perdeu a vida e ainda sofre as consequências
psicológicas e físicas dessa violência, como uma lesão no rim, retrata o
universo de discriminação aos gays, transexuais e travestis presos no
estado. O caso de Felipe chocou os defensores de direitos humanos e
culminou na criação do espaço Sem Preconceitos, no pavilhão E do
Presídio de Igarassu. O lugar é destinado especificamente para esses
gêneros. Limpo e ventilado, é repleto de frases contra a homofobia e as
oito celas, sete com duas pessoas e uma com quatro, foram decoradas com
desenhos como corações e flores.
De acordo com o diretor do presídio, coronel Benício Caetano, o
ingresso ao pavilhão é voluntário e para quem deseja estar fora do
convívio com os cerca de 3,5 mil detentos da unidade, população oito
vezes maior que o recomendado. Áreas semelhantes a essa também existem
no Complexo do Curado, antigo Aníbal Bruno, e na Penitenciária
Agroindustrial São João, na Ilha de Itamaracá.
“Eles são obrigados a limpar as celas, lavar roupas e cozinhar”,
ressalta o promotor. A travesti Juliana Matarazzo, 22, presa há sete
meses por tráfico de drogas, pediu para ficar no espaço. “Um dia,
acordei com o rosto cheio de esperma e ainda queriam me obrigar a fazer
sexo no banheiro”, lembrou.
O Grupo de Trabalho e Prevenção Positiva (GTP+) identificou que a
violência psicológica, seguida dos problemas de saúde, são as principais
queixas dos transgêneros no Presídio de Igarassu. As agressões físicas
aparecem como a terceira demanda.
“O grupo diz ser invisível. Para ele, os direitos humanos são voz apenas
para os heterossexuais”, diz o coordenador pedagógico André Guedes.
“Estamos fazendo um trabalho, chamado Projeto Fortalecer, para superar
preconceitos. Queremos que o presídio não seja visto somente como
punição, mas também como espaço socioeducativo”, acrescenta Guedes. O
grupo atua desde o início do ano no Presídio de Igarassu, mas já
acompanhou os reeducandos do Complexo do Curado.
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